INFORMATIVO 04 – IMPACTOS JURÍDICOS DA PANDEMIA DO CORONAVÍRUS

INFORMATIVO 04

IMPACTOS JURÍDICOS DA PANDEMIA DO CORONAVÍRUS

(EXTINÇÃO DO CONTRATO DE TRABALHO E A TEORIA DO “FATO DO PRÍNCIPE”)

31 de março de 2020

Em virtude da pandemia provocada pelo COVID-19, o governo tem adotado medidas com o intuito de controlar, ao máximo, a propagação da doença. A exemplo disso, o estado do Piauí, por intermédio do Decreto n° 18.901/2020, suspendeu atividades como funcionamento de bares, cinemas, restaurantes, comércio e shoppings centers. Medidas similares também foram adotadas em outros estados brasileiros. Em vários setores as atividades estão sendo interrompidas temporariamente por meio de determinação estatal, ocasionando uma grande onerosidade para o empregador, que, em alguns casos, tem de dispensar os empregados para evitar a quebra da empresa.

Diante dessa situação, muitos empregadores questionam a responsabilidade do Estado pelo pagamento das verbas rescisórias e indenizatórias em caso de demissão em virtude da paralisação das atividades por ato de governo em que determinou a suspensão das atividades empresariais.

Assim, faz-se necessário conceituar as hipóteses de força maior e factum principis.  A hipótese de força maior está prevista no art. 501[1] da CLT, que diz: “Entende-se como força maior todo acontecimento inevitável, em relação à vontade do empregador, e para a realização do qual este não concorreu, direta ou indiretamente”. Já o factum principis é uma espécie do gênero força maior, uma vez que depende de determinação de autoridade governamental, ou seja, para sua configuração deverá ocorrer a cessação do trabalho por imposição de autoridade pública, sem culpa do empregador, tendo previsão no art. 486[2] da CLT.

A Medida Provisória nº 927/2020 prevê, no Parágrafo Único, art. 1º, que se está diante de um cenário de força maior. Com isso, entende-se que, para fins jurídicos e trabalhistas, a pandemia em razão do COVID-19 deve ser enquadrada como uma situação de força maior.

Partindo do entendimento de que a pandemia se enquadra como hipótese de força maior, tem-se que a rescisão do contrato de trabalho deve ser feita nos termos estabelecidos no artigo 502[3] da CLT e que é possível a redução do salário em até 25%, respeitado o mínimo legal, conforme estabelece o artigo 503[4] da CLT.

Dessa forma, as obrigações decorrentes da rescisão do contrato de trabalho são de responsabilidade do empregador. Poderá ocorrer, contudo, que no caso de extinção da empresa ou de um dos estabelecimentos em que o empregado trabalhe, a indenização da multa do FGTS reduzirá de 40% para 20%.

Embora a lei não seja explícita com relação à indenização do aviso prévio e a doutrina não convergir nesse ponto, entende-se que a extinção por força maior desobriga o empregador de pagar esta verba indenizatória, haja vista a ocorrência de evento imprevisível.

Já para aplicação da extinção do contrato de trabalho por factum principis, espécie da força maior, necessário analisar se o decreto que determinou a suspensão das atividades da empresa atinge a relação contratual entre o empregado e o empregador a ponto de torna o Poder Público responsável pelo pagamento de verbas indenizatórias decorrente da extinção do contrato de trabalho. Com isso, de forma consensual, sendo hipótese para a aplicação da “Teoria do fato do príncipe”, a indenização da multa do FGTS deve ser paga pela Administração Pública. Já quanto ao aviso prévio, há divergência nesse ponto.

Ocorre que, para que se tenha configurado o fato do príncipe, necessária a cumulação de três requisitos: ato do poder público ou lei; paralisação temporária ou definitiva do trabalho e impossibilidade de continuação da atividade.

É notório, e independe de prova: (1º) a existência do Decreto n° 18.901/2020, do estado do Piauí; (2º) que determina a suspensão das atividades da empresa de todos os setores, exceto àqueles essenciais; e (3º) a impossibilidade de continuação das atividades durante a vigência do estado de calamidade.

Entretanto, a suspensão das atividades decretada pelo estado do Piauí não é uma opção do poder público, mas decorre de expressa recomendação da Organização Mundial da Saúde (OMS) com o objetivo de diminuir a transmissão do vírus. De outro lado, referido decreto atinge indiscriminadamente todos os setores produtivos e não um em particular.

Portanto, a interrupção da atividade empresarial, decretada por autoridade pública, não desonera o empregador de suas responsabilidades, posto que o Poder Público não é parte contratual e o risco da atividade econômica é do empregador, nos termos do artigo 2º, §2º da CLT. Por fim, ainda não é possível precisar como será o entendimento do Judiciário  Trabalhista diante das medidas adotas que visam proteger a saúde pública.

Teresina, 31 de março de 2020.

CORDÃO, SAID E VILLA – SOCIEDADE DE ADVOGADOS

OAB/PI nº 0022/2009

 

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FONTES:

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2020/Mpv/mpv927.htm

https://pmt.pi.gov.br/wp-content/uploads/sites/34/2020/03/Decreto-nA%CC%82%C2%BA-19.548-de-29.03.2020-.pdf

https://www.conjur.com.br/2020-mar-27/uso-artigo-clt-citado-bolsonaro-nao-consensual

https://www.migalhas.com.br/depeso/321936/a-forca-maior-e-o-coronavirus

[1]  Art. 501 – Entende-se como força maior todo acontecimento inevitável, em relação à vontade do empregador, e para a realização do qual este não concorreu, direta ou indiretamente.

[2] Art. 486 – No caso de paralisação temporária ou definitiva do trabalho, motivada por ato de autoridade municipal, estadual ou federal, ou pela promulgação de lei ou resolução que impossibilite a continuação da atividade, prevalecerá o pagamento da indenização, que ficará a cargo do governo responsável.

[3] Art. 502 – Ocorrendo motivo de força maior que determine a extinção da empresa, ou de um dos estabelecimentos em que trabalhe o empregado, é assegurada a este, quando despedido, uma indenização na forma seguinte: I – sendo estável, nos termos dos arts. 477 e 478; II – não tendo direito à estabilidade, metade da que seria devida em caso de rescisão sem justa causa; III – havendo contrato por prazo determinado, aquela a que se refere o art. 479 desta Lei, reduzida igualmente à metade.

[4] Art. 503 – É lícita, em caso de força maior ou prejuízos devidamente comprovados, a redução geral dos salários dos empregados da empresa, proporcionalmente aos salários de cada um, não podendo, entretanto, ser superior a 25% (vinte e cinco por cento), respeitado, em qualquer caso, o salário mínimo da região.

Parágrafo único – Cessados os efeitos decorrentes do motivo de força maior, é garantido o restabelecimento dos salários reduzidos